Desilusão... (para uma amiga e a propósito de horóscopos)

Vamos pela vida intercalando épocas de entusiasmo com épocas de desilusão. De vez em quando andamos inchados como velas e caminhamos velozes pelo mar do mundo; noutras ocasiões - mais frequentes do que as outras - estamos murchos como folhas que o tempo engelhou.

Temos períodos dourados, em que caminhamos sobre nuvens e tudo nos parece maravilhoso, e outros - tão cinzentos! - em que talvez nos apetecesse adormecer e ficar assim durante o tempo necessário para que tudo voltasse a ser como era dantes.
Acontece-nos a todos e constitui, sem dúvida, um sinal de imaturidade. Somos ainda crianças em muitos aspectos.

A verdade é que não temos razões para nos deixarmos levar demasiado por entusiasmos, pois já devíamos ter aprendido que não podem ser duradouros.

A vida é que é, e não pode ser mais do que isso.

Desejamos muito uma coisa, pensamos que se a alcançarmos obtemos uma espécie de céu, batemo-nos por ela com todas as forças. Mas quando, finalmente, obtemos o que tanto desejávamos, passamos por duas fases desconcertantes. A primeira é um medo terrível de perder o que conquistámos: porque conhecemos o que aconteceu anteriormente a outras pessoas em situações semelhantes à nossa; porque existe a morte, a doença, o roubo...

A segunda fase chega com o tempo e não costuma demorar muito: sucede que aquilo que obtivemos perde - lentamente ou de um dia para o outro - o encanto. Gastou-se o dourado, esboroou-se o algodão das nuvens. Aquilo já não nos proporciona um paraíso.

E é nesse momento que chega a desilusão, com todo o seu cortejo de possíveis consequências desagradáveis: podem passar-nos pela cabeça coisas como mudarmos de profissão, mudarmos de clube, trocarmos de automóvel ou de casa, divorciarmo-nos... E, então, surge o desejo de partir atrás de outro entusiasmo: queremos voltar a amar...

Nunca mais conseguimos aprender o que é o amor.

Se nos desiludimos, a culpa não está nas coisas nem está nas outras pessoas. Se nos desiludimos, a culpa é nossa: porque nos deixámos iludir; porque nos deixámos levar por uma ilusão. Uma ilusão - há quem ganhe a vida a fazer ilusionismo - consiste em vestir com uma roupagem excessiva e falsa a realidade, de modo a distorcê-la ou a fazê-la parecer mais do que aquilo que é.

Quando nos desiludimos não estamos a ser justos, nem com as pessoas nem com as coisas.
Nenhuma pessoa, nenhuma das coisas com que lidamos podem satisfazer plenamente o nosso desejo de bem, de felicidade, de beleza. Em primeiro lugar porque não são perfeitas (só a ilusão pode, temporariamente, fazer-nos ver nelas a perfeição). Depois, porque não são incorruptíveis nem eternas: gastam-se, engelham-se, engordam, quebram-se, ganham rugas... terminam.

Aquilo que procuramos - faz parte da nossa estrutura, não o podemos evitar - é perfeito e não tem fim. E não nos contentamos com menos de que isso. É por essa razão que nos desiludimos e que de novo nos iludimos: andamos sempre à procura...

De resto, se todos ambicionamos um bem perfeito e eterno, ele deve existir. Só pode acontecer que exista.
Tudo será diferente quando acreditarmos que, após uma conquista nos devemos agarrar a ela e ter a consciência de que todos os dias será melhor se a cultivarmos, se a regarmos. Que ela nos trará muita coisa nova e importante. Porque, nessa altura, ela está só no princípio e há muito ainda a construir. Só assim conseguimos não precisar de nos voltarmos a iludir após cada conquista.

2 d´um raio:

egoïste disse...

«Quando nos desiludimos não estamos a ser justos, nem com as pessoas nem com as coisas.
Nenhuma pessoa, nenhuma das coisas com que lidamos podem satisfazer plenamente o nosso desejo de bem, de felicidade, de beleza. Em primeiro lugar porque não são perfeitas (só a ilusão pode, temporariamente, fazer-nos ver nelas a perfeição). Depois, porque não são incorruptíveis nem eternas: gastam-se, engelham-se, engordam, quebram-se, ganham rugas... terminam.»

... disseste tudo!

Adorei!

Bj**

Galena disse...

Como eu te entendo... depende só de nós deixarmo-nos levar por essas ilusões, que por mais estranho ainda somos nós que as criamos, é na nossa cabeça que achamos que os outros são perfeitos e que nunca nos vão desiludir... e nós? não desiludimos os outros? não faremos parte da ilusão de outros, não nos iludimos a nós mesmos?
Somos realmente nuito complexos... mas sabes, o nosso principal problema é querer que tudo seja eterno, que tudo o que é bom seja para sempre. Não queremos aceitar que tudo são passagens na nossa vida, que a própria vida é uma passagem, um caminho e que tantas pessoas vamos encontrar nesse camminho. Temos tanto medo de ser infelizes que nos agarramos às coisas e às pessoas com medo, com medo?? mas medo do quê?? pergunto eu? medo do desconhecido?
Deviamos ser ensinados na escola que tudo o que vivemos é para ser intensamente... e que sim nenhuma garantia temos de nada... apenas ter a noção que estamos vivos e que não estamos sozinhos, e que podemos e devemos fazer tudo o que está ao nosso alcance para fazer os outros felizes... se ao menos conseguimos funcionar assim... (contra mim falo...)
um beijo...

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